Pensar Hoje - retratos do agora

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Os dons bem bons

É bonito ver os dons. Eles independem da situação em que a pessoa se encontra: todos têm algum. Por vezes, eles se tornam até uma obrigação porque podem ajudar outras pessoas, quiçá mudar suas vidas. E não é necessário que se seja um ídolo, somos todos humanos. Por favor, continuemos humanos.

sábado, 4 de dezembro de 2010

E o tempo?

Ele é imutável, mas o sentimos passar. Cabe tanto em um olhar quanto em toda nossa vida. Não podemos medi-lo, já que não nos é físico. Ainda assim, estabelecemos na existência passos para ele: nove meses para nascer, um ano de sofrimento, décadas de diversão, milênios de solidão. Algumas dessas são compreensíveis, outras não.

Uns dizem não entender o porquê de um segundo ser tão importante, outros que nele pode estar toda a nossa vida, todo nosso propósito, ao acontecer. E a medida, tão igual a todos porque passa à mesmíssima maneira para cada um, encontra dúvidas. Se ele fosse realmente assim, não teríamos nossas exclamações: "já?", "ainda?", "é cedo!", "é tarde!".

Parece que ele depende de um observador: quando contamos os segundos no relógio, eles demoram a passar. Ao nos divertirmos, os segundos transformam-se em horas passadas. À última hora da vida, quando sabida, é impossível a hora ter maior valor. E esse tempo todo, no fim, para onde vai?

Investimos-no, certamente finito, em coisas vãs ou necessárias, alegrias e agruras. Mas quando mesmo foi a última vez em que paramos a vida, a que quase certamente passa afoita e às vezes perde a paisagem, para prestar muita atenção no nada que temos dentro e fora?

É uma ofensa à vida ou à existência percebermos ter, dentro de nossos sis, enormes vácuos esperando para serem contemplados? O grande céu, azul e límpido, escuro e mais notívago ou claro e em formas de bolos, acha-se como uma vastidão que nos parece vazia ao olho nu. No entanto, atrai inúmeros observadores n'onde sua incolumidade e... quase inexistência congrega olhares estupefatos para sua imensidão.

Sua alternância de matizes nos dá o horário e nos orienta a dormir e a acordar. Define, pouco a pouco, quanto temos para cumprir nossa jornada, e nos permite ou obriga a uma pausa a cada período.

Só uma pergunta: para a pausa ser um descanso, o céu tem de estar fora ou dentro de nós?

sexta-feira, 2 de abril de 2010

E hoje o pensar muda para o que era antes

Passei, ontem, por um lugar querido.

Como muitos sabem, lugares queridos emocionam. Revi algumas pessoas muito importantes na vida. Não, não são líderes, professores, chefes. São pessoas que compunham o dia-a-dia, formavam parte da vida e da rotina.

É uma homenagem a essas pessoas que constroem parte de nossa vida sem que saibamos - ou, até, sem que elas próprias saibam. De atendentes de padaria a garçons de bares, frentistas ou até funcionários de estacionamentos, pessoas fazem vidas sem que sequer percebam - ou, se percebem, o fazem muito bem.

Parece estranho, mas percebemos muito disso só depois de mudarmos para outro lugar. E, se não nos revisitamos, não vemos o que fomos e talvez também não percebamos quem podemos ser.

Mais bonito ainda é rever certos brilhos nos olhos. Estes não podemos descrever, então cabe a nós cuidarmos de guardar, amanhã podemos não voltar.

Muito obrigado.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

O tempo chora

Lavando nossas almas, ele nos surpreende com a clareza de algo que está por vir. Nesse momento, perguntamo-nos o que há além da cortina. Diz ele contar o que realmente queríamos ouvir ou falar. O imprescindível então resseca nossas lágrimas para entendermos mais, contarmos melhor, lermos nas entrelinhas. Não é possível, dizemos. O céu só nos diz para parar. Parar. E observar.

Assim quero ficar, por um belo tempo, até a compreensão vier e me acordar, contando a história para eu poder dormir.

É breve o tempo chorando. Só que dura muito.

Hoje choveu.

domingo, 19 de julho de 2009

Rebelião

O espírito sem resposta também não tem casa. Ela é uma música que cantamos a toda hora quando criamos uma ilusão em nossa cabeça: a vida tem, tem de dizer, nos dá a sensação de que tudo poderia ser feito quando sim, é verdade!

A ilusão nem sempre é algo falso. E serve, muito bem, para dizer-nos que algo, que já existe, existe. Digo porque nem sempre sou ouvido. Esse objeto pode precisar de amparo para viver ou cai no sincero esquecimento. E esquecer, também, não é não lembrar, porque ninguém esquece.

Lembrando a arte do amparo, precisamos dele. Não porque somos únicos ou mais juntos, é que não dá para fazer tudo. Daí acontece. A revolta? Também não é revolução, é só vontade de mexer, remexer. A revolução só acontece se alguém tiver mexido os ovos, senão tudo são branco e amarelo.

Aos olhos de quem vê o ovo, o irmão diz tudo: "sou amarelo e você preto, azul, verde, castanho. Contudo, temos muito em comum. Mas por que você não nasce, assim como eu?". Somos caso a se pensar, reflitamos. Não há como amalgamar a massa fluida ao nosso duro julgamento, ele só enrijece e devemos aproveitar enquanto podemos ver.

Ou sentir. E nisso construímos as rebeliões dentro de nós, por isso nos sentimos impertinentes. Dói mas é. Viver sempre fará falta, também aproveitemos. Nada melhor que uma revolta para voltar, continuar o que era com outra cara, diferente.

A vida não é cara.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

epitáfio

falece hoje, 10 de fevereiro de 2009, seu Juarez. companheiro de café, alegre notívago, garçom há mais de trinta anos, amigo reclamão. levará consigo canetas orgulhosamente conquistadas pelo árduo trabalho. será sentida falta de tudo: a copa tinindo, o café sempre quente, fumegante às dez da noite e às três da madrugada, os sanduíches caprichados e as palavras contentes mesmo no trabalho mais duro. aposentara-se há quatro meses e ainda trabalhava. alforriou-se há dias, mas a vida estava no hotel em que trabalhava. deixa saudades e palavras consistentemente verdadeiras que permanecerão intactas pelo tempo.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

O cantil

Duas almas desalmadas nem aos céus podem recorrer; suas barracas também não são tão símbolos de segurança, tampouco o céu que teria em enganá-los. O peso é parco, a idéia de realidade já inexiste. Não há nada para buscar na barraca, só o som zunido do deserto consegue entrar em seus ouvidos, até nas almas desalmadas.

O mapa? Ainda nada diz. Consertar o carro só dá a esperança de encher o cantil mais uma vez. A direção só é decidida, não que seja certa. O passo parco só garante um erro menor: não se sabe onde estará o novo cantil. Mas o binóculo diz mais! Pena que ainda estamos longe.

Mas o cantil d'agora é importante, é importante. Tenhamos determinação, amanhã poderá ser melhor. É por lá, diz ele! E seguiremos, vamos seguir, não podemos perder mais tempo. Ou, mesmo que percamos, façamos algo para não pararmos. E não há discussão nessas horas: um está tão perdido quanto o outro e nenhum mapa diz nada, até as estrelas mentem para nós.

A escravatura ainda não acabou, digo. Temos duas barracas para nós dois, mas parece que só uma existe. Uma é igualzinha à outra, mas o sono em ambas é ruim, ruim de uma forma diferente. E ah, a do escravo só é mais iluminada porque ele precisa trabalhar.

Um mundo está longe, mas o nosso é menor: busquemos! E eu quero, também, o cantil. Mas calma, calma. Deverá passar tudo isso, espero. E quando isso tudo passar, deveremos rir do que aconteceu, ou então nos separarmos e irmos cada um para seu caminho. Mas de tanto tempo longe, não lembro qual é o caminho. Não temos mais história, qual o sentido?

Não quero, não quero matar! Sou ainda honesto, mesmo que o capataz sem causa continue aqui. Vamos seguindo. Mas o capataz não perdoa a nada. A saída não é justa, ela só servirá para ele. E os reprimidos? Que continuem escravos, ele acha. Se não podemos consertar o que tivemos, joguemo-nos fora. Sigamos, sigamos, sigamos a algo que não sabemos o que é: o cantil é importante.

Ele me deixou sem água. Fenecerá ele! E não é por vingança, não. É que ele se acostumou com água, a ele vai faltar, já estou acostumado sem: o corpo a tudo se adapta quando a alma é forte. E a mais um pesadelo não suportarei, se ele pensa que é esperto, ignorância plena: vou tomar um restinho de água aqui.

... e ele ainda consegue achar as estrelas bonitas! Não, não suporto. E agora a água acabou até para ele. Quero ver qual lápide o acolherá, porque agora será só ele a procurar sentido na vida! Porque a minha serão os grãos de areia que já correm pelas minhas mãos...

... baseado na peça O cantil do grupo Teatro Máquina no Centro Cultural São Paulo - texto escrito em 28/11/2008.